Viver o trauma de guerra: Ajudar a Igreja na Ucrânia, um compromisso da Fundação AIS

Padre Walery Dubyna | Foto: AIS

São jovens, ainda não têm idade para a mobilização militar, mas vivem já com medo. A guerra, na Ucrânia, assusta tudo e todos. Os mais novos sabem que um dia poderão ser chamados também para as trincheiras, para os lugares da morte onde estão agora os seus pais, os seus tios, os seus familiares e amigos. Não é fácil lidar com isto. Mas é isso que a Igreja se propõe fazer: estar ao lado dos mais novos num dos momentos mais difíceis de sempre da vida do país

A Missa tinha começado quando se escutaram as sirenes de ataque aéreo. Mesmo para quem já se habituou a isso, há sempre um frémito de medo, de receio pelo que possa acontecer. Às vezes, é apenas falso alarme. Mas, outras vezes, os céus transformam-se em palcos de batalha com mísseis que procuram abater outros mísseis carregados de explosivos e que trazem um alvo pré-definido. Um alvo que pode ser a nossa casa, a nossa escola, o nosso hospital… É sempre assustador. Basta acompanhar as imagens das televisões, com reportagens sobre ataques em aldeias, vilas e cidades para se perceber o medo que o simples toque das sirenes pode provocar. Foi isso que aconteceu durante essa Missa. As sirenes começaram a tocar e uma rapariga ficou em pânico. A Irmã Aneta Tobiaz estava lá e recorda-se bem do olhar assustado da jovem. “As crianças vivem com medo. Às vezes conseguem descrevê-lo, outras não. Quando soaram as sirenes do ataque aéreo, a rapariga virou-se para mim, horrorizada, e perguntou-me o que fazer…. Temos de lidar com a situação de alguma forma…” Mas não é fácil.

Medo e impotência

Não é fácil, de facto. A guerra está presente em todo o lado. Muitas famílias carregam a angústia de saberem que os seus maridos, os seus pais, irmãos, filhos, estão na linha da frente com uma arma nas mãos a defender o país. O número de mortos e feridos, o número de mutilados desta guerra é já astronómico. E os jovens são forçados a lidar com isso todos os dias. Este medo, esta sensação de impotência é o primeiro campo de batalha que muitos rapazes e raparigas da Ucrânia têm enfrentado, desde que o país foi invadido a 24 de Fevereiro de 2022. Têm de aprender a conviver com isso. É muito difícil e doloroso. A Igreja procura dar respostas, procura ser um ombro amigo, procura estar ao lado destes jovens revoltados e assustados. Essa é também a preocupação do Pe. Waleriy Dubyna. Ele é um dos responsáveis da Pastoral Juvenil e a sua missão é ajudar a “construir o futuro”. “Este é um tempo para estar com eles e para eles. Eles, os jovens, têm perguntas difíceis e conseguem perceber se alguém está a fingir ou se está aberto aos seus pensamentos”, diz. Com os jovens só a verdade conta. Por isso, diz ainda este sacerdote, a “Palavra de Deus traz consolo e esperança”. 

Um futuro hipotecado

E como esse consolo e essa esperança são importantes num país que tem de lutar de armas na mão todos os dias pela sua própria sobrevivência… Face a um inimigo poderoso que o quer destruir, é preciso ter esperança. Caso contrário, explica ainda o Pe. Dubyna, “desesperamos e rendemo-nos rapidamente”. Alimentar a esperança é uma das missões também da Pastoral Juvenil. Mostrar, aos mais novos, que apesar dos tempos dramáticos que se estão a viver, eles não estão sós. De facto, os jovens ucranianos têm muito para se queixar. Vivem num país em guerra, veem a sua terra ser destruída todos os dias e sabem que o seu próprio futuro está, de alguma forma, já hipotecado. Querem ser jovens e obrigam-nos a ser adultos cedo de mais. A Irmã Aneta conhece bem esta revolta surda que vai crescendo nos pensamentos, este sentimento, este tumulto. A irmã lida com isso todos os dias, escuta palavras cheias de medo, mas também de revolta dos seus jovens, a quem chama de “seus filhos”. E compreende-os. “Os meus filhos dizem-me que estão a crescer depressa…” Mas também se apercebem, nessa voragem do tempo, que o mundo onde estão a viver precisa, e muito, de solidariedade. “Eles também se abriram aos outros, por vezes noto isso, quando me dizem que a pessoa ao meu lado precisa de ajuda…” 

“Não podemos deixá-los sozinhos”

Este é um tempo duro. O futuro dos jovens da Ucrânia é uma incógnita. De certa forma está a ser decidido nas trincheiras, onde os mais velhos, os pais, tios e amigos lutam de armas na mão. É o futuro de um país e de uma geração que está a ser conquistado com sangue e muitas lágrimas. O papel da Igreja é, por isso, incrivelmente importante. “A missão da Pastoral Juvenil é mostrar aos nossos filhos que a Igreja não é um padre ou o Papa, mas que eles são a Igreja. Em breve – diz o Pe. Dubyna – estes jovens tornar-se-ão adultos. Não podemos deixá-los sozinhos…” Ajudar estes jovens é também uma das missões da Fundação AIS, através do apoio que é dado directamente à Pastoral Juvenil e a todos os sacerdotes e religiosas que todos os dias amparam e protegem os rapazes e as raparigas da Ucrânia. Muitos estão já de luto. A Ucrânia é um país em guerra em pleno coração da Europa. É bom não esquecer isso…

Paulo Aido