Domingo de Ramos: Bispo apela aos cristãos que procurem um novo horizonte de esperança que só Deus pode oferecer

O prelado pediu ainda que saibamos acolher a “bem-aventurança dirigida ao ‘bom ladrão’ e a quantos se dispõem a caminhar na esperança”.

Foto: Duarte Gomes

O bispo do Funchal presidiu na manhã deste domingo, dia 13 de abril, na Sé do Funchal, à Eucaristia do Domingo de Ramos, dia em que se celebra a entrada solene de Jesus em Jerusalém, que marca o começo da Semana Santa e dispõe os cristãos para reviver a Paixão, Morte e Ressurreição do Senhor.

Uma oportunidade para o prelado desafiar os cristãos a procurar, “um novo horizonte de esperança que apenas Deus pode oferecer e garantir.”

Numa reflexão centrada no momento em que Jesus é crucificado juntamente com dois malfeitores e no diálogo que se estabelece entre eles, D. Nuno Brás não só chama a atenção para a postura diferente dos dois homens como explica que ao malfeitor “lhe pedia e se dava por contente com uma simples recordação (“lembra-te de mim”), Jesus oferece a partilha da Sua vida (“estarás comigo”). E o Senhor vai bem mais longe: oferece a partilha da sua vida “no paraíso”, quer dizer: a participação na vida eterna, na vida divina.”

Esta surpreendente e singular afirmação de Jesus, vincou o prelado, “abre, para aquele homem (e para nós), um novo horizonte de esperança que apenas Deus pode oferecer e garantir.”

“Ou seja: neste homem encontramos o modo de viver e de morrer do cristão”, explicou, para logo acrescentar que “se a sua vida foi marcada pelo pecado, neste momento decisivo ela é marcada pelo arrependimento, pela conversão; se a sua vida foi marcada apenas pelo presente e pelos prazeres que ele oferece, o momento decisivo, partilhado com o Senhor, é marcado por uma infinita abertura de horizontes; se a sua vida foi marcada pelo egoísmo, este seu momento decisivo é marcado por uma entrega confiante nas mãos de Deus que vive e sofre a morte humana em primeira pessoa.” 

A resposta do Senhor àquele que a tradição chama de’“bom ladrão’ “ilumina o nosso momento decisivo do encontro com Jesus, e também o nosso modo de viver.”

De resto, continuou D. Nuno Brás, “mal seria que, por estratégia humana enganadora ou por simples preguiça e tibieza, adiássemos a nossa conversão para um momento último que desconhecemos.”

Por isso “acolhemos, também nós, esta bem-aventurança dirigida ao ‘bom ladrão’ e a quantos se dispõem a caminhar na esperança. Entregamos o que somos nas mãos do Senhor; pedimos-Lhe que nos ajude a viver seriamente a tarefa de salvação que Ele nos confía”, concluíu.

Leia da íntegra a homilía do prelado:

DOMINGO DE RAMOS DA PAIXÃO DO SENHOR (C) 
Sé do Funchal  
13 de abril de 2025 

“Hoje mesmo estarás comigo no paraíso” 

1. Nãés tu o Messias? Salva-te a ti mesmo e a nós também”. No desafio lançado pelo malfeitor crucificado com Jesus, ecoam as tentações que meditávamos no Iº Domingo da Quaresma. S. Lucas, depois de resumir as nossas tentações na facilidade, no poder e no espetáculo, e de mostrar como Jesus lhes respondeu com firmeza, terminava: “E o demónio afastou-se até um determinado momento”. 

Entendemos agora que o evangelista se referia ao momento da Paixão. É o momento decisivo. Aquele em que tudo o que foi anunciado e vivido pode ser posto em causa. Aquele momento em que a liberdade humana vive a sua opção mais fundamental. Aquele em que Jesus poderia ter dito: tudo está terminado; diante da morte, já nada mais vale a pena. Ou, então, em que o Senhor poderia ter optado por um golpe espetacular para descer da cruz e continuar a sua vida. Mas, se assim fosse, teria deixado de ser o Messias Salvador, o Filho amado do Pai. 

A tentação que Jesus tem diante de si — e que o primeiro dos malfeitores lhe apresenta — é aquela de uma salvação que se resume ao viver o aqui e agora, porventura de um modo confortável, mas sem outros horizontes de vida; é a tentação de poder viver mais uns dias, livrando-se da cruz e da terrível morte que ela provocava.  Mas é, principalmente, a tentação de uma auto-salvação: Salva-te a ti mesmo”. É o modo de viver de quem não encontra para a sua existência nada mais a não ser aquilo que foi capaz de realizar, de conquistar. É o modo de esperar meramente humano, sem Deus. 

2. Bem diferente é a atitude do outro malfeitor. Em primeiro lugar porque reconhece que no homem que, ao seu lado, vive o suplício da cruz, está Deus – Deus que experimenta, que partilha a sua morte, a morte humana, a morte de todos: Não temes a Deus, tu que sofres o mesmo suplício?”. 

Depois porque, apesar do seu pecado e da sua vida, aquele malfeitor se entrega confiante, nas mãos do SenhorJesus, lembra-te de mim quando vieres na tua realeza”. E, juntamente com a entrega de tudo quanto é nas mãos do Senhor, no espírito daquele homem surge um outro horizonte, para além do mero aqui e agora: quando vieres na tua realeza. Por isso, pôde escutar de JesusHoje mesmo estarás comigo no paraíso”. 

3. Esta surpreendente e singular afirmação de Jesus abre, para aquele homem (e para nós), um novo horizonte de esperança que apenas Deus pode oferecer e garantir. 

Ao malfeitor que confessa o seu pecado (s recebemos o castigo das nossas más ações”) e que, ousadamente, lhe pede a vida para o fim dos tempos, Jesus oferece a vida hoje”. Àquele que lhe pedia e se dava por contente com uma simples recordação (lembra-te de mim), Jesus oferece a partilha da Sua vida (estarás comigo”). E o Senhor vai bem mais longe: oferece a partilha da sua vida no paraíso”, quer dizer: a participação na vida eterna, na vida divina. 

Ou seja: neste homem encontramos o modo de viver e de morrer do cristão. Se a sua vida foi marcada pelo pecado, neste momento decisivo ela é marcada pelo arrependimento, pela conversão; se a sua vida foi marcada apenas pelo presente e pelos prazeres que ele oferece, o momento decisivo, partilhado com o Senhor, é marcado por uma infinita abertura de horizontes; se a sua vida foi marcada pelo egoísmo, este seu momento decisivo é marcado por uma entrega confiante nas mãos de Deus que vive e sofre a morte humana em primeira pessoa. Tudo se encontra nas mãos do Senhor. 

Mas o Deus feito homem foi ainda mais longe. Apenas Ele o poderia fazer. É o momento da graça sobreabundante, da graça que nos oferece aquilo que nem sequer ousamos pedir e esperar: Hoje mesmo estarás comigo no paraíso”.  

4. A resposta do Senhor àquele que a tradição chama de bom ladrão” ilumina o nosso momento decisivo do encontro com Jesus, e também o nosso modo de viver. 

Com efeito, mal seria que, por estratégia humana enganadora ou por simples preguiça e tibieza, adiássemos a nossa conversão para um momento último que desconhecemos. De facto, ignoramos o momento da nossa morte, e apenas podemos procurar estar sempre preparados para ele. Acresce ainda que o caminho, a peregrinação da esperança, não admite a resignação e a passividade. Quando o Senhor vem ao nosso encontro, seja qual for o momento da nossa vida, só podemos, como resposta, deixar tudo para O seguir. 

E (sobretudo) porque aquele que escuta do Senhor as palavras estarás comigo no paraíso” (que são as palavras que Jesus pronúncia ao coração de quantos se convertem de verdade) — aquele que acolhe esta feliz notícia” (Evangelho), recebe ao mesmo tempo uma missão: a tarefa de ser anunciador de esperança para todos os seus irmãos; a tarefa de transformar o mundo, de mudar a sociedade em que vive (cada um e todos, e todas as suas estruturas). Do egoísta salva-te a ti mesmo (que molda tanto o nosso modo de viver), é-lhe confiada a tarefa de ser presença da redenção: apenas Jesus nos pode salvar e oferecer a salvação. 

“Hoje estarás comigo no paraíso”: diante da cruz do Senhor, acolhemos, também nós, esta bem-aventurança dirigida ao “bom ladrão” e a quantos se dispõem a caminhar na esperança. Entregamos o que somos nas mãos do Senhor; pedimos-Lhe que nos ajude a viver seriamente a tarefa de salvação que Ele nos confia.