O Cardeal Tolentino de Mendonça pediu este domingo, dia 4 de junho, a todos quantos quiseram marcar presença na Missa de corpo presente da sua mãe, Maria de Fátima Calaça, a que o mesmo presidiu, para que “olhem para os nossos idosos como uma força de vida muito grande, porque nós vivemos numa grande mudança de época, sabemos como se valoriza muito a produção, se valorizam muito todas as ferramentas que agora existem e muitas vezes se esquece a humanidade”.
“Eu vejo que a minha mãe, com os seus 88 anos, vinha de um mundo diferente. Hoje ter 88 anos é como ter duzentos ou trezentos, porque o mundo mudou tanto, mas essas pessoas são um depositário de humanidade, de memória, de tradição de conhecimento de um modo de ver e discernir a realidade, isso é um tesouro muito grande”, explicou D. Tolentino Mendonça, para logo vincar que “como sociedades que envelhecem, perceber que a velhice é também um recurso humano de que nós precisamos muito para nos reconciliarmos mais profundamente com a vida, com aquilo que ela é”.
E aí, prosseguiu, “a morte não tem de ser um tabu e se nós a habitarmos com amor é como a casca do fruto que nós conseguimos romper e descobrir a beleza daquilo que está por dentro, de reforçarmos a nossa fé e olhar para o Mistério de Deus do qual nos alimentamos sempre.
Numa Eucaristia concelebrada pelo Bispo do Funchal e por vários outros membros do clero madeirense, nomeadamente pelo Cónego Ramos, o cardeal começou por aludir “a estas ocasiões que a vida nos dá e que o Senhor nos permite que é experiência da morte, são muito importantes para tocarmos dimensões fundamentais de Deus e da nossa humanidade”.
Neste dia em que a Igreja celebrava a Santíssima Trindade, um mistério de Deus que, ao longo da nossa vida, nos chama a sermos próximos, D. Tolentino sublinhou que este mistério é “uma forma de conhecimento, uma possibilidade de uma relação, um chamamento a irmos mais fundo, a tocarmos alguma coisa de significativo de Deus e da nossa humanidade”.
Dando um exemplo prático do que acabara de afirmar, o Cardeal lembrou que “todos os frutos têm uma casca, que pode ser mais espessa ou mais fina e nós, desde pequeninos, aprendemos a ir além da casca para tocar o fundo”. Quer dizer, “em relação a todas as coisas há uma barreira, um limite, um mistério, mas somos chamados a ir mais fundo para tocarmos o sabor real das coisas”.
“Com Deus, quando nós passamos além da casca, além da fadiga dos conceitos, além desta distância natural, porque Deus é Deus e nós somos criaturas, quando nós nos abrimos como que a casca se desfaz”.
E ouvimos as palavras de Deus que “amou tanto o mundo que entregou o seu filho humano, para que toda a gente tenha a vida e ampliá-la em Jesus”. Assim, “percebemos que também nós somos chamados a construir trindades viver a nossa vida segundo o ritmo trinitário, porque cada um de nós é um, na sua história, na sua solidão irredutível, descobrimo-nos incompletos insuficientes”.
E aí, continuou, “precisamos do dois e o dois são, primeiramente, os que nos complementam seja na experiência de amor ou de amizade”. Porém, “o amor não é para ficar no dois”. O amor é para incluir o terceiro, que é aquele que nos faz experimentar o amor, o amor que já não é apenas da minha satisfação e da minha completude, mas é um amor oblativo, que vem sem esperar nada em troca, um amor que vem para dar vida e vida em plenitude”.
É a partir daqui que “aprendemos como viver, como construir”, aprendemos que “Deus é a medida da nossa vida”.
Por isso, acrescentou, “acompanhar a nossa mãe aqui a esta igreja, onde ela rezou tantas vezes, onde escutou a palavra de Deus, onde viveu os mistérios de Deus e onde cresceu como cristã, faz todo o sentido, é um passar por este lugar sagrado que lhe deu tanto”.
Pessoa simples, Maria de Fátima Calaça “conseguiu, com as ferramentas que todo o batizado tem, construir a sua vida espiritual” e sobretudo de, como todas as mães, “de embalar a vida de a gerar e acompanhar e ver tudo com outros olhos, os olhos de amor e era assim que ela via”.
O Cardeal Tolentino Mendonça agradeceu, em seu nome e no da família presente nesta hora, “a sua vida, o que ela viveu, até mesmo os seus sofrimentos, porque ela teve essa capacidade de, entregando, transformar em dádiva e em amor”.
Coube ao bispo do Funchal o rito da encomendação, que aconteceu quase no fim da celebração em que marcaram presença diversas entidades, nomeadamente o presidente da Assembleia Legislativa, a secretária do Ambiente, em representação do Governo, e o presidente da Câmara de Machico.
Antes da bênção final D. Tolentino Mendonça agradeceu a todos os presentes, mas também a quem manifestou o seu pesar à sua família e a ele próprio. Agradeceu ainda a D. Nuno Brás e aos sacerdotes que quiseram estar presentes, ao cónego Manuel Ramos e a todos os sacerdotes que quiseram acompanhar-nos neste momento e às autoridades presentes.
Para último, mas não menos importante, agradeceu a quem cuidou da mãe, particularmente nos últimos dias, mencionando a família e os profissionais de saúde dos Hospitais Nélio Mendonça, Marmeleiros e João de Almada (Cuidados Paliativos). Seguiu-se o cortejo fúnebre para o cemitério Municipal de Machico.