“A Cáritas é marca credível de cuidado pela sociedade” – D. José Traquinas

O presidente da Comissão Episcopal da Pastoral Social e Mobilidade Humana preside ao Conselho Geral da instituição que decorre pela primeira vez no Funchal e reúne 17 das 20 Cáritas existentes.

Foto: Duarte Gomes

Na sessão de abertura do Conselho Geral da Cáritas Portuguesa, que está a decorrer pela primeira vez no Funchal, sessão esta que teve lugar na Igreja do Colégio, D. José Traquina, presidente da Comissão Episcopal da Pastoral Social e Mobilidade Humana, disse que estes conselhos têm sido uma oportunidade para “conhecer uma Cáritas e beneficiar do seu testemunho e dedicação permanente, em procurar responder com maior eficiência e qualidade aos desafios que se apresentam à Cáritas Portuguesa e às Cáritas Diocesanas”.

Depois de vincar que a Cáritas é uma “marca credível de cuidado pela sociedade”, o bispo de Santarém acrescentou que um dos pontos em análise neste conselho é “a revisão dos Estatutos do Plano Institucional de Resposta Emergência em catástrofes”.

Neste contexto e tendo em conta que existem Cáritas espalhadas por todo o país, isto é próximas da população, o bispo prosseguiu afirmando que a Cáritas está disponível, nos diversos níveis para “dialogar com o Estado as instituições publicas para apresentar as suas reflexões de forma coordenada e com bons resultados”.

Lembrando que “os pobres no mundo e as alterações climáticas são os dois assuntos mais graves da agenda das Nações Unidas”assegurou que a Cáritas, representando a Igreja “quer fazer parte da solução”.

Rita Valadas, presidente da Cáritas Portuguesa também usou da palavra nesta sessão para sublinhar que “a Cáritas tem vindo a usar esta reunião para abordar temas que são do interesse de todos convidando para isso pessoas e parceiros que nos ajudam a refletir sobre eles”.

Enalteceu depois o trabalho que é desenvolvido em rede, que deve continuar a ser reforçado porque permite ter “radares, ter pessoas, em diversos pontos do país que ajudem a ler a realidade maior a proximidade”. Especialmente nestes tempos em que há desafios novos para responder com rapidez, nomeadamente os novos tipos de pobreza e a situação dos migrantes”.

Seguiu-se uma breve intervenção de Duarte Pacheco, presidente da Cáritas Diocesana do Funchal que deu as boas-vindas a todos e que destacou o facto deste ser “um momento muito importante da história da Cáritas Portuguesa, da Cáritas do Funchal, da Diocese e da Ilha”.

Maior rigor nos apoios

Já o presidente da Câmara do Funchal deixou à reflexão dos presentes a forma como são canalizados os apoios.

“Que tipo de ajuda é que nós queremos dar às pessoas? Queremos continuar a ter uma sociedade assistencialista, uma sociedade subsidiodependência, ou uma sociedade em que nós vamos dar condições às pessoas para produzirem mais e melhor?”, questionou.

Pedro Calado disse ainda que, num país que tem cada vez mais limitações e dificuldades, é necessário canalizar os apoios a quem efetivamente mais precisa e alargar esses apoios a mais pessoas.

O presidente da autarquia partilhou algumas estatísticas para ajudar a fazer uma “correta” reflexão sobre que “caminho nós estamos a construir e que bases é que nós estamos a criar para a sustentabilidade da nossa sociedade”.

O edil apresentou dados mais recentes sobre a natalidade, o envelhecimento, a fecundidade, a produtividade e o emprego, que indicam que cada vez há menos jovens, menos nascimentos e cada vez é maior o peso da população com mais idade, na Região. Uma realidade que não é muito diferente do que se passa a nível nacional.

“Estamos numa sociedade envelhecida, numa sociedade cuja população ativa não é suficiente, para trabalhar e aguentar a população mais idosa”, alertou. Neste contexto, defendeu “que há que ter a coragem de uma vez por todas para reformular todo o sistema do país”.

“Enquanto não tivermos capacidade de atrair jovens para trabalhar, com menos horas, com melhores condições, nós não temos a capacidade de chamar jovens para serem pais e mães e construir uma sociedade justa, plena de direitos e de igualdades, mas sobretudo equilibrada”, afirmou.

O autarca referiu que quem está na Cáritas e tem a função de ajudar não tem uma função mais leve, do que aqueles que tem funções públicas e que todos os dias são chamados a acudir a um cem número de pedidos de apoio.

O presidente da CMF citou “que mais importante do que dar o peixe é ensinar a pescar”, sublinhando que isto “obriga-nos a dar condições às pessoas para produzirem mais e melhor, e sermos mais justos com quem realmente precisa.

Pedro Calado alertou ainda para o estranho paradoxo: “a sociedade vai evoluindo, nós vamos tendo melhores condições, algum dinamismo económico, comercial, social, mais liberdade, mais democracia, toda a gente a fazer mais e melhor, e depois no final parece que existe cada vez mais dependência, cada vez mais necessidade, cada vez mais ajuda. Há que refletir e pensar onde e como é que chegamos até aqui e que caminho é que nós queremos fazer daqui para a frente”.

O rosto mais definido da caridade

A finalizar as intervenções usou da palavra D. Nuno Brás que saudou todos os presentes, incluindo a família Barreto que “sempre tem apoiado a Cáritas” e foi, inclusivamente alvo de uma homenagem neste dia e que sublinhou que “a caridade é o amor Deus que brota no nosso coração e do nosso coração, é um amor espontâneo”.

A Cáritas, vincou, “é verdadeiramente tudo isto do amor de Deus do coração de Deus a pulsar e a impulsionar a caridade da Igreja”.

Apesar de ser muitas vezes uma caridade imediata, porque as circunstâncias assim o exigem, tem de ser também uma “caridade pensada e organizada porque é uma caridade que pretende transformar a própria sociedade”.

E se é verdade que a caridade tem muitos rostos, D. Nuno Brás frisou que “a Cáritas é o rosto mais definido da caridade de Deus”, o que não é “motivo de glória, mas de responsabilidade”, acrescentou.

Reforço da Economia Social

O Presidente da Assembleia Legislativa foi o orador da conferência sobre “A importância das Organizações Sociais” que se seguiu à sessão de abertura, moderada por Paula Margarido.

“A Economia Social é, atualmente, um setor decisivo na criação de riqueza e de emprego, mas, principalmente, na prestação de serviços essenciais às populações e à manutenção da paz social na Região e no país”, começou por referir.

Na ocasião José Manuel Rodrigues defendeu que os Estados e os Governos devem promover a Economia Social e apoiar as Instituições de Solidariedade Social (IPSS), mas, também, lembrou que as IPSS têm de apostar na sustentabilidade, na formação dos seus profissionais, no trabalho em rede” e devem contribuir para uma “sociedade mais justa e mais inclusiva”.

“Na saúde, na proteção social, na educação e noutras áreas da nossa comunidade, o trabalho das instituições de solidariedade e das empresas sem fins lucrativos é, desde há muito, imprescindível para as nossas comunidades”, constatou.

José Manuel Rodrigues considera que “estas organizações, pela sua proximidade às populações e pela flexibilidade com que operam no terreno, chegam de forma mais célere e respondem com maior eficácia do que as instituições públicas às necessidades e urgências das pessoas”. Lembrou que “este terceiro setor da economia é composto por 55 mil entidades, emprega 260 mil trabalhadores e já representa 4 por cento do Produto Interno Bruto português”.

Reconheceu que “os Parlamentos, os Governos, as autarquias, todas as instituições públicas têm de aperfeiçoar políticas dirigidas ao setor social das nossas comunidades”.

“Só num sistema de Cooperação entre Estado, Privados e Setor Social será possível ultrapassar as dificuldades do momento, mas sobretudo enfrentar a crise anunciada”, disse.

“Sou daqueles que defendem um reforço do pilar social da economia e de mais incentivos aos agentes das IPSS e das Misericórdias, não apenas como um complemento do público, mas como um setor autónomo que pode e deve prestar serviço público em nome do Estado”.

“Mas permitam-me que vos diga: nunca abdiquem da vossa autonomia em troca de qualquer dependência financeira; nunca se deixem estatizar por qualquer subsídio; nunca deixem de ser a emanação das sociedades onde têm origem; nunca se esqueçam de dar esperança ao sofrimento; nunca se esqueçam da bem-aventurança da vossa criação”, alertou.

Numa conjuntura de crise, em que é preciso atuar em várias frentes, o presidente da ALM apontou “três enormes desafios”, que se colocam a estas instituições, a começar por “saber como sobreviver e ter sustentabilidade perante um aumento dos custos e uma tendência para uma descida do financiamento público”.

O segundo desafio tem a ver com a necessidade de “responder aos novos problemas sociais, particularmente os emergentes, derivados da pandemia e da guerra, que se constatam, nomeadamente, no aumento das dependências e nos casos da doença mental.”

“E terceiro, contribuir para uma sociedade mais justa, mais inclusiva, menos assistencialista, em que cada cidadão e família dispõem dos meios financeiros necessários ao seu sustento e à sua afirmação social”.

Neste quadro social, José Manuel Rodrigues entente que as IPSS devem estar “menos dependentes dos apoios estatais, com uma organização semelhante a uma pequena empresa que presta serviços, com contrapartidas financeiras, suportadas pelos cidadãos e famílias que os podem pagar, aumentando também a responsabilidade social das empresas e das comunidades no apoio ao seu funcionamento”.

Sugeriu também “uma melhor profissionalização e formação dos dirigentes e dos colaboradores das IPSS, elaborando projetos com novas valências e serviços e uma melhor especialização, articulada com os profissionais de saúde”, assim como mais trabalho em rede, “criando sinergias, não desperdiçando recursos, nem duplicando ajudas e serviços, e pondo todos os meios ao serviço das famílias necessitadas”.

“Independentemente das respostas a estes desafios, a verdade é que cada um tem a sua Missão, mas é igualmente certo que aos Estados e aos Governos compete promover a Economia Social e apoiar as Instituições da Igreja e as Organizações de Solidariedade Social, porque estas são decisivas para evitar ruturas no tecido social e para termos terras mais justas e com mais oportunidades para todos”, concluiu.

Menos famílias ajudadas

Antes desta iniciativa decorreu uma conferência de imprensa, em que se ficou a saber que, este ano, o número de famílias madeirenses ajudadas pela Cáritas “diminuiu drasticamente”.

Duarte Pacheco presidente da instituição disse que no ao passado foram apoiadas 750 famílias, número este que, até meados de novembro, não passava das 550.

O apoio alimentar continua no topo das ajudas, seguindo-se o apoio à compra de medicamentos, a disponibilização de mobiliário e electrodomésticos, estes últimos em situações específicas.

Atendendo ao quadro atual Duarte Pacheco crê que este número poderá voltar a aumentar, já que as famílias vão sentir mais dificuldades em suportar encargos, nomeadamente com a habitação.

Presente neste encontro com os jornalistas, D. José Traquina, presidente da Comissão Episcopal da Pastoral Social e Mobilidade Humana, destacou o papel da instituição na “ajuda a quem governa”, e de dar apoio a quem precisa.

O bispo de Santarém referia-se ao papel que a Cáritas tem, junto das instituições governativas como radares reais dos problemas da sociedade.

O presidente da Comissão Episcopal da Pastoral Social e Mobilidade Humana vincou, no entanto, que o apoio da Cáritas não deve ser encarado como permanente, mas antes transitório porque “não queremos alimentar a pobreza eternamente”.

Os trabalhos deste Conselho Geral terminaram este domingo, dia 27 de novembro, com uma Eucaristia às 12.30 Horas, na Sé, presidida por D. Nuno Brás.