“Sabia que o ´ukelele´, o instrumento musical típico do Havai, é o cavaquinho alterado por madeirenses para ali emigrados?” Esta questão abriu-me a curiosidade para o livro, “Mandem saudades. Uma longínqua história de emigração”, de Mário Augusto, publicado no mês passado, pela Fundação Francisco Manuel dos Santos.
Nesta obra, apresenta-se um retrato da aventura da emigração portuguesa para o Havai. Uma história feita sonhos e lágrimas. Em três décadas, chegaram ao Havai 29 embarcações, com cerca de 20 mil portugueses. O primeiro a aportar em Honolulu foi o veleiro “Priscilla”, em 1878. Trazia 63 homens, 16 mulheres e 35 crianças. Todos madeirenses.
A viagem era demorada, entre cinco a seis meses, em barcos com péssimas condições, superlotados e com poucos alimentos.
Os que partiam eram aliciados por promessas de uma vida melhor, mas encontraram outra realidade: trabalho duro nos campos de cana-de-açucar. Como tinham assinado contratos de trabalho que incluíam o pagamento da viagem, ficavam presos por vários anos. “Eram necessários trabalhadores onde noutros tempos laboravam escravos. Os engajadores, muitos deles estrangeiros que andavam pelas aldeias a aliciar pessoas para emigrarem, recebiam por isso comissões das agências de emigração”, escreve Mário Augusto.
Em 1879, três madeirenses levaram na bagagem um instrumento típico da Madeira: a braguinha. Não podiam imaginar o sucesso que iria ter. Manuel Nunes conseguiu autorização do rei para o seu fabrico com a legenda “Fabricado por Manuel Nunes – o inventor do ‘ukelele’”. “Aquela espécie de viola pequenina de apenas quatro cordas, que acompanhava os passageiros da longa viagem nas cantorias, para animar ou matar o tempo, chegou ao Pacífico para se tornar um dos símbolos maiores do Havai”, escreve o autor do livro “Mandem saudades”.
Os madeirenses levaram também no coração as suas tradições religiosas, principalmente a devoção a Nossa Senhora, a quem rezavam nos momentos de maior aflição. Em 1901, a comunidade madeirense construiu em Kalihi, perto da capital do Havai, a igreja de Nossa Senhora do Monte.
“A coisa mais importante que queremos guardar… são estas tradições, as memórias dos nossos antepassados. As tradições, o saber e os valores”, disse Audrey Rocha Reed, filha de madeirenses, uma das guardiãs da cultura portuguesa no Havai. “Eu nasci numa plantação de açúcar, no campo de Hamakuapoko, fui a mais nova de uma família de 11 filhos. Sou a única viva. Os meus pais vieram crianças da Madeira, eu conheci bem a realidade e as histórias dos primeiros que chegaram”.