Há dias, numa pequena tertúlia improvisada veio a questão: se quisermos chegar aos 100 anos, que precisamos de fazer desde já? O uso de quisermos foi intencional, também me incluía no grupo. Uma das respostas era unilateral: isso depende de Deus. Custou a chegar, mas chegou outra palavra. Eu teria que deixar o tabaco. A conversa continuou e divagou-se. A certa altura a mudança já era sobre a droga e excesso de alimentos.
Será possível fazer mudanças acertadas e mantê-las para envelhecer com saúde e vida ativa contente? No dia 24 de julho, o dia mundial dos avós e idosos, vem lembrar que mesmo na velhice se dá fruto (salmo 92). Há vários tipos de bons frutos, do fazer e do ser. Nem só frutos de saúde e de atividade. Estamos saturados de tratar os avós e idosos como máquinas inúteis. Um idoso pode continuar a ser bondoso e fazer o bem, mesmo doente. Incluindo-me no número dos idosos desejo valorizar o meu dia-a-dia a fazer o bem que posso e a ser um dom partilhado, mesmo com menos saúde. Mas voltando ao tema. A questão pode ser: que precisa fazer o idoso, antes de chegar a idade avançada para nela ter (alguma) saúde e viver ativo a fazer o bem? O objetivo de envelhecer saudavelmente entra na categoria de recompensas nocivas adiadas. Este adiamento contraria o fazer tudo o que dá prazer, já, e dizer: vamos comer, beber e gozar; a vida são dois dias. Adiar o que nos pode estragar com doenças, começa muito antes da velhice. Um médico aconselhava que já pelos trinta anos é preciso pôr de lado muito do que vai pôr em risco a saúde. Um da tertúlia lá veio com a mudança que tinha que fazer: comer menos, por pertencer, no dizer dos médicos, ao grupo dos obesos, de um em cada três. Mudança difícil, mas possível e necessária para receber a boa paga da saúde, agora e dezenas de anos mais tarde. E se a pessoa não quer ou não pode? Se continua a comer o que lhe dá na gana, mesmo nocivo? Não é boa com ela.
Os conselheiros de ajuda e saúde conhecem bem as frustrações em casos semelhantes. E os especialistas do cérebro conhecem bem como os estímulos e aliciamentos exteriores ao sistema bio-cerebral enfraquecem e avariam a capacidade de decisões de saúde e bem-estar. E também sabem que o processo de capacitar saberes de adiamento de recompensas e reforços agradáveis levou séculos a conquistar para cada povo saber adiar a jorna de um dia, o salário de um mês, a reforma de uma vida. Numa palavra, serem pessoas de saber e de vidas com sentido. De ignorantes dos riscos de reforços em prazeres, passam a saber que são seres de vida prolongada. O salário no fim do mês, um diploma de exames, a reforma pé-de-meia, saúde e harmonia são recompensas preparadas nos desertos da vida austera para serem ansiadas e recebidas mais além na vida longa e feliz. Os desejos maquinais “do já”, explorados pelo marketing social, opõem-se aos anseios de ser infindo em que se enxerta a fé das religiões de vida eterna. A nível superior a vida tem um sentido de saber-se ser de verdade, bondade, beleza e relação pessoal aberta ao bem de todos, sempre à frente das satisfações imediatas e narcisistas. A verdade não se pode separar do ser perene. Razão tinha um da tertúlia quando dizia que se deixasse de mentir a todos e a si, poderia dizer não à droga. Também o primeiro passo dos alcoólicos é a verdade em vez de a mentira: “finalmente dizem os AA, reconhecemos” que somos incapazes do não ao álcool, e já não mentimos a nós e aos outros sobre a nossa força de vontade (falsa) sempre a consumir.
O individuo aprende a conhecer-se e a usar o seu cérebro-máquina, mais complexo que o computador, para envelhecer com saber do eu-consciência. As investigações do cérebro com ressonâncias magnéticas (RM) sugerem que é necessário saber mais do cérebro e mais cedo para evitar erros e mentiras contra a vida saudável e harmoniosa a fluir nos anos avançados. E esse conhecimento tem a ver com a “ciência do pecado”, segundo o neurocientista Jack Lewis; nalgumas áreas do cérebro estudado com RM, observa, os apetites dos sete pecados impõem-se constantemente às ordens do orgulho. Cada eu-consciência pode saber mais, sem mentira, do ser que deseja ser, já e mais tarde, não apenas de satisfações instantes, mas de salários do ser idoso e de ser de vida eterna. «Não está escrito nos salmos que Deus guarda todas as nossas lágrimas (Salmo 56,8)? Por isso, talvez, nenhum dos sofrimentos tenha sido em vão”» (Viktor FRANKL, “O homem em busca de um sentido” 2017, p.120). A mentira do ego inchado é o maior inimigo da saúde e dos seres humanos.
Funchal, dia mundial dos Avós e dos Idosos, 24.07-2022