D. Nuno reconheceu e agradeceu trabalho das Irmãs Franciscanas Missionárias de Maria

Foto: Duarte Gomes

O bispo do Funchal presidiu na manhã deste sábado, dia 30 de novembro, a uma Eucaristia inserida nas comemorações dos 125 anos da presença em Portugal (122 na Madeira) das Franciscanas Missionárias de Maria (FMM).

No início da celebração, D. Nuno Brás fez questão de reconhecer e de agradecer “o trabalho e o papel das Irmãs na nossa Ilha”, nomeadamente em prol da Educação e de colocar junto ao altar do Senhor “também as irmãs Clarissas, que aqui estiveram desde a fundação desta casa”.

Em dia litúrgico do apóstolo Santo André, o prelado começou precisamente por fazer referência ao Evangelho e ao facto de André, tal como o seu irmão Simão chamado Pedro, ter largado as redes e seguido, sem hesitar, o convite do Senhor para que O seguissem, porque este iria fazer deles «pescadores de homens».

Este imediatismo na decisão contrasta com a nossa atitude de constante “ponderação sobre aquilo que havemos de fazer ou ser”, quando na verdade “isso não nos devia inquietar assim tanto, porque também nós recebemos este chamamento, e percebemos esta presença do Senhor”, esta “presença grande de Deus ao nosso lado”, que quase permite O toquemos. 

Quando “Deus passa por nós transforma a nossa vida” e é precisamente isto que acontece “com a vocação grandiosa de ser Cristão”. E é grande, explicou, “porque percebemos este Deus assim ao nosso lado, grande porque encontramos o Messias”. É esta realidade que “nos faz missionários” e nos faz perceber que essa mesma realidade é demasiado boa para ser só para nós e que temos de a partilhar com os outros. De resto, disse, “ser missionário brota da existência cristã” é o “perceber Deus no meio da nossa vida” e a importância de partilhar isso com os outros.

Nesta sua reflexão, D. Nuno lembrou ainda que estes 122 anos de presença na Madeira e 125 em Portugal das FMM, são também “testemunho da presença missionária, de uma presença que mostra Deus testemunho, de uma presença que não deixa de nos convidar a todos a uma vida melhor, a uma vida com mais qualidade, a uma vida mais cristã”. Por tudo isso voltou a “dar graças a Deus” e a pedir ao Senhor que “por intercessão de Santo André, nos ajude a ser assim missionários, a manifestar esta sua presença, esta sua proximidade”, “a viver a naturalidade de ser cristão” e a “não calar aquilo que vimos e ouvimos”.

Memória espiritual, devocional e patrimonial

Antes desta Eucaristia celebrativa, que foi concelebrada pelos bispos eméritos e por outros membros do clero, realizaram-se duas intervenções, a primeira das quais a cargo da Dr.ª Rita Rodrigues. A investigadora procurou sintetizar os 500 anos do espaço, numa comunicação intitulada “Convento de Santa Clara do Funchal: Preservar uma memória espiritual, devocional e patrimonial”.

Inserido na malha urbana da cidade, a maior parte das pessoas desconhece a real dimensão física deste espaço, a cuja história a oradora se referiu, mas usando uma cronologia invertida, ou seja, do presente para o passado.

E falar do presente do convento é falar das obras que estão e vão continuar a ser levadas a cabo no espaço e que visam a sua conservação. Trata-se de um projeto que está a ser desenvolvido pela Direção Regional da Cultura, de que se deu conta numa pequena mostra realizada no Museu Frederico de Freitas, adiantando um pouco daquilo que será o resultado final.

Mas falar do convento é falar do seu rico património imóvel, móvel integrado e móvel, com leituras sobre a arquitetura, escultura, talha, pintura, azulejaria e ourivesaria. 

Ao longo dos anos, as instituições competentes, os historiadores e investigadores têm tido a preocupação de divulgar esse património, nomeadamente através de várias publicações e exposições, regionais e nacionais, procurando sempre chamar a atenção para a importância do mesmo, no sentido da sua conservação e valorização. 

Outra das chamadas de atenção da oradora foi para o facto de algumas dessas peças, já não se encontrem nos seus locais originais, mas noutros locais como, por exemplo, no Museu de Arte Sacra, o que permitiu uma melhor conservação e valorização das mesmas, tanto mais que as localizações primitivas não eram as melhores. 

A Igreja e o Convento de Santa Clara possuem, de facto, um significativo espólio artístico que abarca diferentes linguagens e gramáticas estilísticas que vão desde a sua fundação até ao século XX.

É possível encontrar testemunhos do século XV, como é o portal da igreja, aproveitado da antiga capela de Nossa Senhora da Conceição de Cima, ainda do tempo de João Gonçalves Zarco, e o túmulo gótico de Martim Mendes de Vasconcelos, no interior da igreja.

No coro alto subsistem testemunhos do século XV e XVI como são os azulejos hispano-mouriscos cujas caraterísticas identificam produção sevilhana, que cobrem o chão; um cadeiral; o teto mudéjar; uma pintura a óleo sobre tábua, Assunção e Coroação da Virgem, atribuída ao pintor Fernão Gomes. Mais tardios, já do século XVII, são os azulejos que revestem as paredes, azuis e brancos; e uma escultura de Nossa Senhora da Assunção, de inícios do XVII, no altar desta invocação; para além de várias imagens de interesse artístico.

No coro baixo, são também do século XVI os azulejos hispano-mouriscos, que cobrem o pavimento; um retábulo misto, composto por uma escultura em madeira e uma pintura sobre tábua, alusivo ao tema do Calvário; um altar da invocação de S. António. Já dos séculos XVII e XVIII são as várias pinturas de oficinas regionais e um cadeiral do século XVIII.

Já na capela de S. Gonçalo de Amarante, observam-se no pavimento azulejos de técnica pisana, do século XVI, e nas paredes azulejos de padrões-polícromos já seiscentistas, como um retábulo (talha e pintura) também do século XVII.

No claustro existem várias capelas e altares dignificadas com várias obras de pintura e azulejaria de várias linguagens estilísticas.

Na Igreja do Convento destacam-se ainda o sacrário, em prata, do século XVII, os azulejos que cobrem as paredes, o teto pintado, várias pinturas a óleo sobre tela, e o órgão doado pelo Dr. Romano Santa Clara Gomes, que o adquiriu em hasta pública, mas que deixou o espaço e que acabou sendo doado às irmãs.

A extinção dos conventos e o seu abandono, a dado momento da história, levou à destruição de muitos espaços e do património neles contido. Felizmente Santa Clara não foi o pior desses casos. O regresso das irmãs, ainda que não fossem muitas, permitiu travar esse processo e devolver ao convento o aspecto humano e afetivo, que ele continua ainda hoje a manter.

A vida dentro do convento

A segunda intervenção da manhã esteve a cargo da Irmã Rosário Nunes que falou sobre a vida das FMM dentro do convento e da missão de servir, que as irmãs procuram cumprir e bem.

O Convento de Santa Clara, disse, continua a ser “casa, abraço, regaço materno e mesmo altar”, por onde têm passado centenas e centenas de crianças que se têm sentido acolhidas vivendo cada dia com alegria e esperança.

Hoje como no momento da fundação das FMM, por Maria da Paixão, na Índia, a congregação continua a ser a primeira congregação feminina dedicada à missão universal e à vivência como Igreja, daí as irmãs se assumirem como “mulheres em missão”. E ser, Missionária de Maria é procurar imitar Maria na sua disponibilidade “para aquilo que Cristo quer de nós”.

O grande dinamizador e impulsionador da vinda das FMM para a Madeira já aqui foi mencionado. Foi precisamente o Dr. Romano Santa Clara Gomes, que sempre acompanhou de perto as irmãs que, em 1801, vieram para o Hospital do Funchal, mas que em outubro de 1898, arrancavam com o Colégio de Santa Clara, que então como hoje, continua a olhar de forma especial para as famílias mais desprotegidas.

As irmãs também se dedicaram à promoção e valorização da mulher, que segundo a fundadora tinham e têm uma missão no mundo, seja com a família, seja com os outros.

Eram conhecidas pela humildade, a caridade e pela forma afetiva como acolhiam as crianças que ficavam à sua guarda. Mas apesar do excelente trabalho, em 1910 a atividade das FMM no Funchal volta a ser interrompida, e as irmãs obrigadas a deixar a ilha, debaixo de manifestações de carinho da população. O convento ficou abandonado, sujeito a pilhagens, e muitos dos tesouros artísticos foram roubados e vendidos. Mais uma vez o Dr. Romano empenha-se, compra uma série de peças, entre as quais o órgão, com o sentido de as devolver às irmãs, e mantém a esperança no seu regresso, o que acabaria efetivamente por acontecer.

Em setembro de 1928, no dia 3 de maio, é inaugurada a creche e Jardim de infância, valências que ainda hoje funcionam e a que se juntou a parte do infantário. Hoje, o Semi-internato de Santa Clara, como passou a ser designado o conjunto de valências, acolhe 210 crianças. Mas quando só tinham creche e jardim de infância as irmãs chegaram a ter 850 à sua guarda, com as suas famosas colónias de férias, no Forte de São João Baptista em Machico, com três turnos de 100 crianças.

Hoje, irmãs, pais, famílias e pessoal docente e não docente, formam uma família que procura dar às crianças a oportunidade de desabrocharem no seu tempo certo. 

A missão das irmãs passa ainda, para além do aspecto educativo, por receber os que querem visitar o espaço, por preparar a liturgia diária, por visitar e levar a comunhão aos doentes, acolher os vários grupos de oração, catequese e retiro e pela recitação do terço, de dois em dois meses na rádio.

Além do Funchal, as FMM estão também presentes em São Gonçalo, São Roque do Faial, na Calheta, na Quinta de São Jorge e já estiveram também na Madalena do Mar.

Atendendo ao seu carisma, que tem de ser partilhado, criou-se também os “Amigos do Instituto FMM”, que têm como objetivo aprofundar a espiritualidade de Maria da Paixão e sua atualidade.

Superiora provincial envia mensagem

A iniciar a manhã festiva a Irmã Delina de Castro deu as boas-vindas aos presentes e leu a mensagem da Irmã Provincial das FMM em Portugal, a Irmã Maria Isabel Gomes, em que esta agradecia a presença dos bispos e dos representantes das demais entidades regionais e reconhecia ser este “um dia festivo e significativo para nós”. Na missiva desejava também que este momento seja “um sinal auspicioso da vitalidade e do dinamismo a que somos continuamente chamadas”.

Lembrou ainda que é “importante manter a esperança no futuro” e que “o Deus que nos acompanhou e nos fez crescer é também aquele que nos guiará”. 

Em relação a estes 125 anos, lembrou que as irmãs são hoje, tal como o era a sua fundadora, Maria da Paixão, “agentes evangelização e de promoção, testemunhando que vale a pena seguir Jesus Cristo, servi-Lo nos outros e irradiando a alegria do Evangelho”.