A história inspiradora de uma irmã que nunca desistiu da vida religiosa

Foto: AIS

Por Paulo Aido

“Fui noviça 44 anos…”

Em segredo, Bernardette vivia como se fosse religiosa. Estava no convento, na Bulgária, como noviça, quando a revolução comunista confiscou todos os seus sonhos. Mandaram-na embora de volta à aldeia, mas ela, secretamente, continuou fiel a todos os votos que tinha prometido em oração. Em 1992, com a queda do regime, o convento foi devolvido à Igreja e ela regressou à vida que sempre tinha sonhado…

A Irmã Bernardette sonhava ser religiosa, seguir as pisadas das religiosas que passavam por ali, pela sua aldeia no sul da Bulgária quando era ainda criança. Era um sonho quase impossível. A região era muito pobre e os pais de Bernardette não possuíam forma de dispensar os quatro filhos do duro trabalho dos campos. Estudou até à quarta classe e depois foi, como todas as outras crianças, tomar conta dos animais, da horta, das árvores de fruto. Já em muito pequena que o sonho de seguir a vida religiosa fervilhava na sua cabeça. Um sonho que nunca abandonou e que ganhou urgência, anos mais tarde, no dia em que descobriu, com horror, que um rapaz da aldeia queria casar com ela e até já havia combinado tudo com os seus pais… Apeteceu-lhe fugir. Por sorte, descobriu que num convento, no norte do país, andavam à procura de uma rapariga que ajudasse no trabalho agrícola. Nem de propósito. Bernardette convenceu os pais a aceitar o emprego, fez as malas e partiu. Entrou como empregada no convento das Irmãs Beneditinas Missionárias, em Carevbrod. As irmãs tomavam conta de crianças pobres e cuidavam de pessoas doentes. Ao fim de um ano, Bernardette entrou para o noviciado. “Cada uma de nós recebeu um véu branco”, recorda. Mas o trabalho continuou, apesar do noviciado. Era uma vida difícil que exigia esforço, dedicação e muito amor. “Levantávamo-nos de madrugada, às quatro horas, para ordenhar as vacas. Só depois íamos para as orações da manhã…” Bernardette gostava daquela vida. Depressa, porém, veio o pesadelo. Em 1948, o Governo comunista declarou guerra à Igreja Católica. Houve julgamentos públicos, muitos sacerdotes foram presos e os conventos foram encerrados. O de Carevbrod também. 

Foto: AIS

Regresso à aldeia

“Os comunistas levaram tudo o que havia: vacas e camas… roubaram tudo.” As noviças foram obrigadas a regressar às suas aldeias. Começou aqui o segredo. A Irmã Bernardette passou a assumir, em silêncio, o seu dia-a-dia como se estivesse no convento. Só ela e Deus sabiam disso. “Saía de casa todas as manhãs, com chuva, neve ou sol, nada me podia deter. Eram 1870 passos de caminho entre a casa e a Igreja. Era o suficiente para dizer todo o rosário. Passava lá as manhãs e as noites.” Bernardette trabalhou como criada num hospital militar, depois tirou um curso de modista e começou a fazer casacos. Mas, acima de tudo, o que gostava mesmo de fazer era ajudar, limpar o chão das capelas, arranjar as flores, cuidar das imagens sagradas e fazer hóstias. O segredo continuava. “O que eu não fiz!… fiz hóstias durante uns 20 anos… Era uma grande responsabilidade….” Bernardette fez tudo para continuar ligada à Igreja que tanto amava. E rezava pelos padres que iam sendo presos por um regime que não tolerava a liberdade religiosa. Muitos morreram às mãos da polícia, muitos sucumbiram na prisão. “Lembro-me de 60, 70 padres. Anotei os seus nomes num cartão. Foram muitos padres….” Foram tempos duros até que o regime caiu perante a urgência da liberdade. Foi em 1992. As irmãs regressaram a Carevbrod. Bernardette também. Para ela foi especial. Voltou a casa. “Tive que esperar 50 anos para regressar, para que Deus permitisse que eu voltasse para lá. Fui noviça durante 44 anos!” Hoje, quando olha para trás, para esses tempos em que viveu a sua vocação em segredo, Bernardette sorri e diz com uma pontinha de orgulho: “Sou feliz”. 

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